9.7.12

Das mentiras necessárias.



Nina estava tentando abrir a porta do carro e ao mesmo tempo impedir suas compras de caírem, quando escutou alguém a chamando.
– Marina! Ei, me deixe te ajudar com isso.
Enquanto ele abria facilmente a porta do carona e colocava as sacolas dentro do veículo, Nina nervosamente enrolou seu rabo-de-cavalo em um coque frouxo. Não sabia bem o que lhe acontecia sempre que ficava tão próxima a Nicolas, mas não era algo agradável de se sentir.
– Pronto – ele anunciou, fechando a porta com segurança e voltando a encará-la.
– Obrigada – Nina sorriu. – Sempre me atrapalho nessa hora.
– Só nessa? – ele riu. – Pelo que me lembro, você costumava ser bastante desastrada.
Nina corou e abaixou os olhos para não encará-lo. Havia um chiclete colado no pneu traseiro do automóvel parado ao lado do seu e um pequeno monte de lixo perto do meio-fio, indicando que logo alguém viria recolhê-lo. Tudo aquilo passou por sua cabeça em segundos, mas foi o suficiente para que Nick se preocupasse.
– Ei – ele segurou o queixo de Nina e ergueu seu rosto para que pudesse examiná-lo. – Tudo bem?
Foi a sinceridade em seu tom que a alertou. Nina jamais poderia fazê-lo sofrer. Não em sã consciência.
– Tudo bem, Nick – murmurou.
– Tem certeza?
– Tenho – Nina afastou seu rosto das mãos masculinas, embora quisesse continuar assim para sempre, e tentou abrir um sorriso. – Estou ótima. E você?
– Também – a resposta veio acompanhada de um sorriso agradável, mas Nina percebeu o tom estranho em sua voz que indicava que Nick não havia engolido sua mentira. – Trabalhando bastante agora que finalmente me decidi em abrir meu próprio escritório.
– Mas isso é ótimo, Nick! Parabéns! O que seu pai achou dessa história?
– Odiou – ele respondeu com uma careta feliz. – Mas isso já era de se esperar. Meu pai queria que eu ficasse eternamente na empresa da família, fortalecendo o negócio.
– Ingenuidade – Nina sacudiu a cabeça. – Você sempre preferiu fazer suas próprias descobertas ao invés de seguir os passos de qualquer outra pessoa.
– Você me conhece mesmo como ninguém – ele riu. – Júlia também não gostou nada dessa minha decisão. Meu pai e ela parecem ter sido feitos do mesmo molde. Mas não você. Você me entende, Marina. Entende de verdade.
Nina sorriu enquanto pensava que, se precisasse abrir mais um falso sorriso durante aquela conversa, começaria a gritar. Odiava esbarrar ocasionalmente em Nick, mas odiava ainda mais quando ele mencionava Júlia naquelas breves conversas. Resolveu então mudar de assunto, mas percebeu não ter feito a melhor escolha assim que a frase saiu de seus lábios.
– Você continua me chamando de Marina depois de todos esses anos.
– Esse é o seu nome.
– Eu sei, mas ninguém me chama assim.
– Mais um motivo para que eu o faça.
– Nick...
– O quê?
– Nada – suspirou ela.
– Tem que ser algo – Nick insistiu.
– É só que... Eu me lembrei de algumas coisas, só isso.
– Sobre a gente? – ele se aproximou tanto que Nina precisou dobrar o pescoço para continuar olhando-o nos olhos.
– Talvez.
– Talvez? – riu ele. – Explique-se melhor.
– Não importa sobre o que é minha lembrança, Nick. Eu não deveria lembrar, só isso.
– Não, não deveria. Mas as lembranças existem para ambos os lados.
– E o que isso quer dizer?
– Que eu também me lembro, às vezes. E que isso sim não deveria acontecer. Não quando estou feliz com outra pessoa.
– Feliz? Mesmo?
Nina não conseguiu se impedir de pronunciar as palavras, mas estranhamente não sentiu arrependimento dessa vez. Precisava saber.
– Muito – respondeu com sinceridade. – Júlia é incrível. Companheira, alegre e segura do que quer.
– Então por quê...
– Porque não sou feito de aço, Marina. Tenho lembranças e elas às vezes levam o melhor de mim. Mas é só isso.
– Só isso.
– É – a resposta veio junto de uma suave carícia com o polegar em sua bochecha que fez Nina se encolher como se tivesse levado um tiro.
– Escuta, Nick, eu preciso ir.
– Ok. Nos vemos?
– Nos vemos.
Mas Nina sabia que estava mentindo mais uma vez.

2 comentários:

  1. falou-se tanto de mentira, mas eu só vi sinceridade. daquelas verdades que parecem escondidas, só que não. é mentira quando ninguém acredita? nem a gente?.

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    1. eles próprios fazem questão de esconder a verdade, mas sabendo, no fundo, que não tem mentira nenhuma ali.

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