29.6.12

Sobre os milhares de Universos.


Já passara de meia-noite quando ela foi ao quarto do filho para um boa noite silencioso. Mas, para sua surpresa, ele ainda estava acordado, abraçado ao seu sapo de pelúcia favorito e encarando o teto como se ali estivessem todas as respostas que procurava, como se fosse um adulto com preocupações maiores do que a sobremesa que fora proibido de comer naquela noite.
- Ei - chamou-o. - Ainda acordado?
- Uhum.
- Não consegue dormir? - ela entrou no quarto e se sentou ao lado dele na pequena cama.
- Não - foi a resposta rápida e seca. Como ele já aprendera aquele tom, ela não sabia. Tinha apenas sete anos de idade, não precisava crescer tão rápido.
- É por causa do bolo de cenoura? Já te disse que você precisa fazer direitinho as tarefas que a professora pede. Do contrário, nada de sobremesa. Ainda que bolo de cenoura seja seu favorito.
- Não é por isso.
- Não? - ela acariciou os cabelos dele, subitamente preocupada. - Está se sentindo mal? Dói em algum lugar?
- Estou bem, mãe.
- Que bom - ela suspirou aliviada, embora sua mão ainda estivesse passeando pela testa do filho em busca de algum sinal de febre. - O que está te preocupando, então, meu amor?
- Nada - ele cruzou os braços sobre o sapo, que se chamava Fred, e fez o bico que caracterizava seus momentos de concentração.
- No que você está pensando, mocinho? - a mãe lhe deu um beijo na testa e lhe pincelou o nariz com o indicador. Ele franziu o rosto, mas logo abriu um sorriso rápido.
- Sabe a Lisa?
- Sei, claro. Aconteceu alguma coisa com ela?
Lisa era a melhor amiga de seu filho. Em todo o Universo, como ele gostava de deixar claro com certa frequência.
- Não. Acho que não - corrigiu.
- Acha?
- Ah, mamãe... - ele se virou de lado, passando a encarar a parede.
- Vai falando, bebê, ou vou fazer cócegas até que você fique cansado de tanto rir - ela ameaçou cutucar as costas dele, mas seu filho voltou a encarar o teto e suspirou. - Vai, me conta.
- Você sabe que a Lisa é minha melhor amiga em todo o Universo, né?
- Claro.
- Só que hoje aconteceu uma coisa lá na escola.
- É mesmo? Vocês brigaram? Tenho certeza que...
- Não, mamãe! Espera eu contar tudo, tá? - reclamou o pequeno.
- Tudo bem - ela escondeu um sorriso.
- Sabe o André?
- Sei.
- Ele me mostrou um cartão que ele ganhou.
- Um cartão? Que legal! De quem foi?
- Não é legal, mãe.
- Por que não?
- Era da Lisa.
- E o que tem? Isso só mostra como ela é uma boa amiga.
- Mas ela deu pro André.
- Meu filho, ela pode ter outros amigos além de você. E você também pode ter outros amigos além dela. É permitido, sabia? Ninguém precisa ficar zangado por isso.
- Ela escreveu no cartão que gosta dele.
- Amigos têm que se gostar, amor.
- Era um gostar diferente, mamãe.
- Diferente? Bom... - ela ficou sem saber o que dizer.
- E sabe o quê mais, mãe?
Mãe, mamãe... A cada momento ele se referia a ela de uma forma diferente, como se estivesse se decidindo se ainda era ou não uma criança. Ela o empurrou gentilmente para o lado e se deitou com ele. Iria dormir ali naquela noite. Logo seu menino seria um homem, e aqueles momentos todos se desvaneceriam.
- O quê?
- Queria que o cartão tivesse sido pra mim.

2 comentários:

  1. Que conto mais fofo :s Muito fofo ele ficar com ciúmes do menininho que a Lisa enviou o cartão, muito fofo mesmo *-* Mostra que crianças sentem ciumes, amam...etc Ç~KLEÇLEK own Amei.
    http://www.senhoritaliberdade.com/

    ResponderExcluir
  2. Obrigada pelo comentário, fiquei muito feliz! Já tinha visto seu blog e achei muito bom. Parabéns pelo conto, tocante!

    ResponderExcluir