7.8.12

Sobre momentos certos.


- Com licença. Que horas são?
Apoiando o copo no balcão, ela olhou para o homem ao seu lado.
- Seu relógio parou ou algo assim? - questionou, indicando o punho dele.
- Isso? Puro enfeite. Não funciona há dias.
Ele se sentou ao lado dela e pediu uma cerveja. Olhando para o outro lado, ela fez uma careta. Era uma mulher de destilados.
- Mesmo? E por que você continua usando?
- Era do meu pai - ele deu de ombros.
- Essa é sua melhor explicação? - franzindo a testa, ela deu mais um gole em seu drink à base de vodca.
- É a única existente - ele sorriu.
- Ok - ela cedeu.
- E então? As horas? - murmurou ele.
- Não uso relógio.
A modo de confirmação, estendeu os braços na frente dele. Em seus punhos, apenas algumas pulseiras.
- Não tem um celular?
- E você não tem? - ela devolveu a pergunta, estranhando aquela insistência quanto às horas. Pensara que aquela história fora apenas uma desculpa para iniciar a conversa, mas ele se prendia ao assunto como se não houvesse amanhã.
- Quem não tem, nos dias de hoje? - ele soltou um riso abafado que a fez desejar escutá-lo de novo.
- Onde está o seu, então? - esquecendo-se de sua bebida, ela se concentrou na conversa.
- Deixei em casa.
- Que conveniente - ela riu.
- Coincidente, eu diria.
- Sei - ela sussurrou.
- Sério - ele riu, terminando a primeira cerveja. - O que você está bebendo?
- Vodca, basicamente - foi a vez de ele fazer uma careta.
- Sou aquele tipo de cara que não abre mão de uma boa cerveja.
- Agradeça por sua camisa.
- Como assim? - ele riu.
- Ela disfarça sua barriga saliente.
- Não tenho nenhuma barriga - ele protestou com veemência.
- Se você diz.
- Faço melhor do que apenas dizer.
Ficando de pé ao lado dela, ele ergueu a camisa preta e também uma sobrancelha, desafiando-a silenciosamente.
- Ok... Retiro o que eu disse.
- Agradeço a consideração - sorrindo, ele voltou a se sentar e pediu mais uma cerveja. A bebida dela permanecia esquecida.
- Achei que fosse mentira aquele papo de abdômen com seis pacotes - ela murmurou, distraída.
- E eu achava mentirosa aquela conversa de duas covinhas em uma só bochecha.
Pela primeira vez em muitos anos, ela se sentiu corar. Enviou um agradecimento mental à pouca luz ambiente e mordeu o lábio inferior, tentando não mostrar desesperadamente suas covinhas em uma risada.
- Certo, já chega de descobertas por hoje.
- Ainda não. Você não me disse as horas.
Rolando os olhos, ela pegou o celular do bolso da calça e observou o visor iluminado.
- Dez para as onze - informou.
- Não é meio tarde para uma moça estar em um bar? Sozinha?
- Ora, isso seria normal se eu fosse um homem? - irritada, ela voltou a guardar o aparelho no bolso.
- Claro. Homens sabem como se defender.
Erguendo ambas as sobrancelhas, ela preparou um chute que foi dar direto no tornozelo dele. Seu gemido de dor foi vingança suficiente.
- Nem todos - sorriu, toda inocência.
- Ok, retiro o que eu disse.
- Agradeço a consideração - ela repetiu as palavras dele, rindo.
- Aí estão aquelas covinhas de novo.
- Deixe minhas covinhas em paz!
- Por hora - ele sorriu, ainda esfregando o local que ela tinha acertado. - Esse foi um bom chute.
- Obrigada. Gosto de ser boa nas coisas que faço.
- E surpreendente, também.
- Minha especialidade.
- Ei, qual o seu nome?
- Levou tempo, uh? - ela riu e ele deu novamente de ombros; parecia ser uma mania.
- Minha especialidade. Aliás, me chamo Daniel.
- Maria Fernanda.
- Sabe, realmente gostei de conversar com você, Maria Fernanda. Mas preciso ir, infelizmente. Trabalho amanhã.
- Em um domingo?
- Em um domingo. Tenho que supervisionar uma obra que está quase concluída e não tive tempo durante a semana.
- Ah... Ok.
Ela se lembrou naquele instante de seu copo e começou a beber em pequenos goles, tentando esconder o sentimento de decepção que de repente sentia.
- Sabe de uma coisa? - em um impulso, ele tirou o relógio e o colocou na frente dela. - Fica com isso.
- Por quê?! - franzindo o cenho, ela pegou o objeto.
- Como uma garantia de que você vai me ligar - ele tirou um cartão do bolso do jeans e colocou na palma da mão dela.
- Vou ligar para você? - ela indagou, segurando o cartão com dedos ansiosos.
- Esse relógio é uma das poucas coisas que ainda tenho do meu pai. Isso significa que vou precisar dele de volta - sorrindo, ele colocou no balcão dinheiro suficiente para pagar pelas bebidas de ambos e, acenando casualmente, foi embora.
Mais tarde naquela noite, ela estava quase adormecendo quando se lembrou vagamente do relógio. Curiosa, pegou o objeto do criado-mudo e tentou focalizar o visor na penumbra. Era quase uma da manhã. Os ponteiros se moviam perfeitamente.


2 comentários:

  1. eu fiquei um pouco confusa em algumas falas, achava que era de um, mas na verdade era do outro... but anyway... gostei :D você escreve tão bem, GG /)

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  2. adorável. leve. me fez flutuar. (e imediatamente começou a tocar call me maybe na minha cabeça sem parar, oh céus).

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