17.1.12

Os vilões somos nós mesmos.



- O que aconteceu? - perguntei à minha irmã assim que ela desligou o celular.
- Acabei de falar com o fornecedor, eles só vão estar aqui lá pelas sete e eu vou ter que esperar. Não poderei chegar ao hospital a tempo da operação... - Júlia passou a mão pelos cabelos, nervosa. - Eu tinha prometido. A irmã dela está no trabalho. Ela vai ficar sozinha... - ouvi seu suspiro de desânimo e uma ideia começou a surgir na minha cabeça. - Vou ligar para o Rick, quem sabe ele...
- Eu vou.
Encarei minha irmã que tinha no rosto uma expressão de descrença. Não pude culpá-la. Desde o término da minha relação com Marina, pouco nos falamos. Nada, na verdade. Júlia, ao contrário, continuara amiga dela como sempre fora. O que às vezes criava algum ou outro conflito entre a gente, aliás.
- Enlouqueceu? - ela murmurou.
- Não. Ela precisa de alguém e estou livre. Além disso, fomos casados, Júlia. Isso conta para alguma coisa.
- É, mas... Não sei se ela vai se sentir confortável com você lá.
- Você a conhece, Júlia. Ela é toda sobre perdão.
- E você precisa de doses cavalares dele - minha irmã alfinetou. Ela nunca perde a oportunidade de me fazer sentir péssimo comigo mesmo quando o assunto é Letícia.
- Então estamos acertados - mudei de assunto. - Que horas ela deve estar na clínica mesmo?
- Daqui meia hora, mais ou menos.
- Certo - peguei o celular, a carteira, as chaves do carro e saí do escritório.
Chegando na clínica, perguntei pela paciente e fui encaminhado a um quarto particular. Ao entrar, mantive o olhar no rosto dela, querendo perceber cada pequena expressão. Ela estava deitada e logo que ergueu a cabeça e me viu, começou a morder o lábio inferior.
- Oi - eu disse e me aproximei.
- Oi... O que você está fazendo aqui? - ah, a pergunta de um milhão de reais.
- Júlia teve um imprevisto no trabalho e...
- Meu Deus... Ela não deveria ter te pedido isso - ela tentou se erguer, mas por algum motivo não conseguiu.
- Ela não me pediu nada. Eu me ofereci.
Os olhos dela ficaram ainda mais brilhantes e cheio de dúvidas. Mas logo uma enfermeira chegou e me perguntou se eu era o acompanhante de Letícia. Respondi que sim e ela logo começou a explicar sobre os procedimentos dali para frente e as milhares de perguntas que continuavam a pairar nos olhos da minha ex-mulher foram deixadas de lado pelo momento.
Minutos depois, o médico chegou e pediu a Letícia que se despisse. Percebi uma hesitação por parte dela, talvez pela minha presença, mas ela fez como pedido. O médico fez algumas marcações no seio esquerdo dela e explicou como faria para retirar os nódulos. Enquanto ele falava, senti um nó começando a se formar na minha garganta. O fato de que Letícia descobrira a doença logo em seu estágio inicial era algo que eu nunca deixaria de agradecer.
E, em algum momento daquelas horas passadas ao lado de Letícia enquanto ela dormia pelo efeito da sedação, minha vida passou diante dos meus olhos. Onde não havia ninguém antes, agora havia uma mulher de olhos tristes e generosos. E eu fazia de tudo para substituir aquela tristeza por um sentimento mais parecido à felicidade. Pena que nenhum dos meus desejos estava gravado em pedra. Ainda. Porque as possibilidades eram infinitas. E o futuro havia apenas começado.

Um comentário:

  1. Que texto lindo, lindo e lindo. Deve ser dificil perder uma pessoa e logo descobrir que esta doente :/ '-'
    http://senhoritaliberdade.blogspot.com/

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