7.1.12

Dias assim.


Quando acordei, percebi que aquele seria um dia realmente confuso. De manhã cedinho, através de minha janela fechada, era possível escutar o barulho da chuva e dos trovões. Estremeci, de frio e algo mais. Aquele dia era domingo e não havia nada de importante que precisasse ser feito; eu poderia ficar na cama o dia todo, e não haveria ninguém para me criticar.
Eu não tinha esse costume, porém, então resolvi olhar algumas velhas fotografias. Talvez tivesse sido um erro bobo para alguém como eu, já tão acostumado a fugir da dor, mas o cometi mesmo assim. Muitos e muitos anos já haviam se passado desde sua morte. Centenas, milhares, milhões de segundos incontáveis que eu não conseguia esquecer.
A primeira foto do álbum fora tirada por um amigo em comum, o mesmo que nos apresentara naquele dia qualquer de janeiro. Observando cada milímetro da imagem para sempre congelada no tempo, lembrei-me da alegria daqueles olhos e também de sua doçura tão forte e sempre presente. Lembrei-me até mesmo do tom de sua voz ao me contar seu nome... Nome que, daquele dia em diante, jamais esqueci.
Passei a página rapidamente, e a dor ficou ainda mais forte. A seguinte fotografia não era colorida nem estava em perfeito estado, mas mesmo olhando-a fixamente, não pude encontrar defeitos. Era a única lembrança do dia em que nos casamos, há muito tempo atrás... Praticamente em outra vida.
As horas foram passando, e o tempo foi mudando conforme o dia se arrastava para o fim. Lá pelo meio da tarde, o calor já era quase insuportável. Fui obrigado a abrir minha janela, e junto foi meu coração. Ela já não voltaria, não importava o quanto eu desejasse tal milagre. Eu sempre soube disso, mas era mais difícil a cada vez que eu precisava aceitar esse fato de novo e outra vez.
Olhei para o mundo através de minha janela e decidi que aquele seria o último dia em que eu me lamentaria. No próximo aniversário de sua morte, eu compraria uma linda rosa vermelha e nada mais. Sem fotos antigas, sem desejos absurdos, sem lágrimas... Apenas esperança pelo segundo abençoado que enfim me unirá a ela. Porque se há no mundo uma coisa em que eu realmente seja bom, é esperar.

6 comentários:

  1. Nossa, senti umas pontadas por dentro ao ler essas palavras tão tristes e carregadas de sofrimento.
    Não importa, algumas coisas duram e outras são rápidas e mesmo assim permanecem pra sempre encravadas em nós.
    Sua escrita é fascinante e teve o poder de me fazer sentir os sentimentos do personagem.

    Beijos e ótimo fim de semana pra ti!

    ResponderExcluir
  2. E que lindas palavras, não? É complicado deixar pra trás algumas coisas, é complicado esquecer algumas coisas e pessoas, costumes ... mas, nada que com muito esforço não consigamos.

    ResponderExcluir
  3. Eu chorei lendo esse conto, de verdade. E há poucas coisas que me emocionam, mas a forma como você narrou fez com que eu me colocasse no lugar da personagem, do narrador, e sentisse sua dor, suas lembranças, sua nostalgia. Lindo, simplesmente lindo.

    http://miasodre.blogspot.com/

    ResponderExcluir
  4. Lindo, lindo demais.
    As lembranças muitas vezes são dolorosas. Na maioria das vezes são dolorosas, ainda mais nesta situação. Me imaginei sendo o personagem da história, e foi triste, foi como se eu tivesse perdido um amor.
    O seu texto me surpreendeu, sucesso pra ti :)
    http://senhoritaliberdade.blogspot.com/

    ResponderExcluir
  5. Quanta intensidade. Terminei de ler seu texto com um nó apertado na garganta, acredito que o verdadeiro escritor não apenas escreve, mas acrescenta vida em cada palavra transliterada. Foi o que vi aqui, vida.
    Um texto magnífico, apesar de triste. Sua escrita cativa, nos prende sem cerimônias.
    Espero voltar, um beijo.

    ResponderExcluir
  6. Que lindo, nossa. Lindo e triste, mas combina com alguns momentos da vida. Me identifiquei com a personagem, sou ótima em esperar também. Como diz a música, "picada de abeia dói menos que amor". Parabéns pelo texto! Beijo.

    ResponderExcluir