18.9.11

Escolhas de solidão.



Meu celular começou a tocar quando eu já estava deitada, quase dormindo. Pensei em deixar pra lá, mas poderia ser alguém querendo me avisar de alguma mudança repentina nos planos do dia seguinte.
Enquanto me erguia da cama e me arrastava até a bolsa, que estava jogada no piso diante da porta do banheiro, percebi que estava perdida no tempo. Não sabia nem que dia da semana era e tive que me esforçar pra me lembrar em que país estava daquela vez.
Olhei ao redor, ao mesmo tempo em que me ajoelhava pra abrir a bolsa e pegar o celular, vendo apenas mais um quarto de hotel. Não havia ninguém no marco da porta ou olhando pela janela ou sentado na cama, esperando pelo meu retorno. Não havia ninguém em absoluto. E isso doeu. Como sempre doía quando eu parava pra pensar no assunto.
Por isso mesmo, joguei a dor pro fundo dessa caixa que todos chamam coração e me concentrei em coisas mais importantes; como aquela ligação tardia, por exemplo. Dei uma olhada rápida no visor, antes de atender, e o número era desconhecido.
Senti como as batidas do meu coração ficavam mais rápidas e, uma a uma, pareciam se atropelar. Eu só conhecia uma pessoa que tinha a irritante mania de bloquear a identificação de seu número. Mas, obviamente, não era ele.
- Oi.
Silêncio.
- Pronto?
- Agora sinto como se estivesse falando com você - ele riu.
Sentei-me no chão e respirei fundo. Aquela voz, aquele riso, aquele tom sutil de implicância que ele adorava usar comigo... Era ele. Olhei de novo para o quarto escuro. Nada parecia real, embora fosse. Encostei a cabeça na parede atrás de mim e fechei os olhos. Tentava me sentir um pouco menos viva; tentava, desesperadamente, não me sentir feliz por ouvi-lo.
- Perdeu a noção do tempo outra vez? - ele hesitou e me senti culpada por ter sido grosseira. Mas era tarde. Em todos os sentidos possíveis.
- Desculpa se eu te acordei. Não consegui mais dormir e...
- Pesadelos? - perguntei com certa ironia permeando a mesma grosseria de antes. Não sabia o que estava fazendo, só queria que ele não tivesse ligado; queria que ele me esquecesse de vez. Por que ele não fazia isso? Por que não me deixava seguir em frente?
- Na verdade, sim. Sonhei que estava completamente careca. Foi surreal, porque uma legião de tesouras corria na minha direção, mas eu já não tinha mais nenhum fio de cabelo. Acordei suando.
- Bom... Você sabe que a parte de não ter mais nenhum fio de cabelo vai acontecer cedo ou tarde.
- Eu não sei de nada disso. Enlouqueceu?
Acabei rindo, pois a paranóia dele com isso era mesmo hilária. E o melhor era que a tal paranóia era totalmente fingida. Nunca conheci ninguém mais desleixado com a aparência do que ele. No que diz respeito a algum personagem, sei que ele até se esforça, mas... Meu Deus! Às vezes me assusta o tanto que o conheço. E me apavora o fato de que ele seja o único na minha vida a ter certos comportamentos. Não quero que ele seja diferente de ninguém. Quero que ele seja apenas mais um cara, mais um ex-namorado, mais um amigo... Mais um. Só mais um.
- Okay, desculpa - sussurrei.
- Hey, você sabe que é brincadeira. Não a parte do pesadelo, claro. Precisava falar com alguém... - aquele silêncio normalmente significava que o que iria ser dito não seria do meu agrado. - Precisava falar com você.
- Assim, em especial?
- É, em especial. Você. Só você.
- No que eu posso te ajudar, então?
- Pequena...
- Não me chama assim.
- Desculpa, foi a força do hábito.
- Que hábito? Você não me chama assim há séculos, no mínimo.
- Desculpa. Não precisa dessa ferocidade toda - suspirei.
- Parece que só estamos pedindo desculpas hoje, hein?
- É.
- Ficou sem palavras?
- Não, só comecei a raciocinar.
- Sobre?
- O telefonema.
- Por quê?
- Não deveria ter ligado.
- Não mesmo.
- Mas liguei.
- Ligou.
- Gostei de ouvir sua voz.
- Também gostei de ouvir a sua.
- Então o telefonema não foi tão em vão assim - aposto que ele sorriu.
- Acho que não.
- Certo... Falo com você depois?
- Claro.
- Ok... Uh... Tchau.
- Tchau.
Desliguei, mas segurei tão forte o aparelho nas mãos que senti meus dedos doerem. Obriguei-me a soltá-lo e o devolvi à bolsa. Passei as mãos pelos cabelos, coloquei algumas mechas atrás das orelhas, apertei os olhos e tentei não me derrubar no processo. Olhei ao redor pela milésima vez com a esperança de que ele estivesse ali, diante de mim ou escondido em algum canto mais sombrio... Mas não havia ninguém. Eu estava sozinha. Eu estava sem ele.

7 comentários:

  1. Essa foto me lembrou uma frase: "Ela tão blackberry, ele tão iPhone"

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  2. Uau.
    Leio muita coisa na internet e também na vida real, sou professora de redação então ler é basicamente o que faço. Mas seu texto tem um ar autêntico, tem seu estilo! Tão bom de ler sabe, o texto flui, o diálogo... Tudo!! Parabéns pelo blog, estou seguindo!
    Beijos!

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  3. Concordo com a professora Taynná.. Teus textos são autênticos.

    Bom início de primavera!

    http://compartilhandosentidos.blogspot.com/

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  4. eu nem duvidava se você me dissesse que é real.

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  5. OMG achei!!!! Eu tinha perdido seu blog e estava desesperada atrás dele e finalmente achei! E como sempre você linda com esses textos lindos! *w*
    www.dinhacavalcante.com

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  6. Sempre que eu passo por aqui, me pergunto por que não volto todos os dias. Seus textos são lindos, Bruna. Lindos mesmo!

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