23.4.11

Rótulos.


Tudo era imensidão. Aquela sensação de que o futuro chegara era indescritível de tão maravilhosa. O mundo repousava em suas mãos e os corpos momentaneamente cansados apenas estavam... deitados ali, um no abraço do outro, como se o amanhã não fosse chegar jamais e ao mesmo tempo já estivesse diante deles, brilhante e colorido. Foi o riso dela, baixo e melodioso como sempre, que o fez voltar a raciocinar.
- O quê? - perguntou ele, ajeitando o corpo feminino contra o seu. - No que essa cabecinha não pára de pensar?
- Não sei bem. Em tudo e em nada.
- Oh, meu bom Deus... Você pode ser direta uma única vez, pra variar? - ambos riram.
- É que... bem, eu estava lembrando de uma conversa que tive há algum tempo.
- E porque você se lembrou dessa tal conversa exatamente agora?
- Não agora, mas hoje...
- O que aconteceu de tão diferente no dia de hoje? - ele perguntou com um tom de displicência na voz bonita.
- Você quer que eu diga mesmo, não é? - ela perguntou sorrindo.
- Quero.
- Ok. Hoje... eu fui pedida em casamento.
- É mesmo? - ele a beijou no rosto e depois encostou sua cabeça na dela, fechando os olhos para saborear melhor o momento. Estar ao lado dela - mais que isso: estar com ela -, era simplesmente renovador.
- Uhum. E eu disse sim, sabe? Ele é um homem incrível. E rico, claro.
- Oh, claro. O que ele faz da vida?
- Ele joga futebol.
- É mesmo? E você, uma jornalista esportiva, foi pedida em casamento por um jogador. Que clichê - ela não pôde evitar o riso.
- Os clichês são apenas verdades ditas milhares de vezes. Não há nada de errado com eles.
- Se você diz.
- Eu digo. Sou jornalista, não se esqueça. Eu não minto.
- Tudo bem - ele lhe beijou rapidamente os lábios e acariciou sua bochecha até que ela abrisse os olhos para encará-lo de frente. - Vamos falar sério... De que conversa você falava?
- Já faz tanto tempo que não sei de quem ouvi, ou se ouvi de tanta gente que já esqueci seus rostos, mas... Costumavam me chamar de maria-chuteira, acredita?
- Maria-chuteira? Logo você, que vai se casar com um jogador de futebol? Imagina.
- Tô falando sério - ela deu uma cotovelada de leve nas costelas dele. - Muito sério. Quando todo mundo ficar sabendo sobre o pedido, vão começar a falar.
- E você se importa com a opinião dessas pessoas?
- Não. Quer dizer, talvez. Já escutei pessoas que, para diminuir meu trabalho, diziam que eu me tornara jornalista somente para estar nesse meio do futebol e conseguir laçar um jogador. Com essas palavras, acredite. Elas não se preocupavam em saber de mim, sabe? Eu que sempre fui apaixonada pelo futebol. Foi tão natural me apaixonar também por você, um jogador, que eu tenho um pouco de receio de que a nossa relação caia na boca de pessoas desse tipo, de mente tão reduzida.
- Pois não devia. As pessoas adoram rotular, princesa. Um homem que faz as unhas é homossexual. Uma mulher que prefira tênis a sandálias de salto é lésbica. Uma linda jornalista esportiva é apenas uma maria-chuteira esperando laçar um peixe grande... Tudo isso é apenas ignorância. O conteúdo dos recipientes pode ser totalmente diferente do que esses rótulos dizem. E, na maioria das vezes, realmente é.
- Uau - a linda e competente jornalista esportiva colocou o próprio corpo em cima do dele e começou a beijar o pescoço do jogador de futebol, seu futuro marido. - E há quem diga que jogadores de futebol são desprovidos de inteligência...

Um comentário:

  1. Sabe, eu li o texto com um sorriso do início ao fim *-* Essas são exatamente as minhas opiniões e gostaria que acontecesse comigo exatamente assim um dia. Seria tão mais fácil. Como eu já te disse, fiquei curiosa pra saber o que eu disse que inspirou o texto, mas fico feliz que tenha sido utilizada como referência. Minha vida é monótona, mas fique a vontade para se colocar no meu lugar e escrever histórias "por mim". Eu não tenho esse seu talento.

    ResponderExcluir