- Bom dia - ele entrou na cozinha apoiando-se na bengala de mogno, presente de seu filho mais velho, e cumprimentou a esposa, como fazia todos os dias.
- Bom dia - ela não se virou de frente para o marido, porém um sorriso apareceu em seu bonito rosto enquanto terminava de passar o café, como fazia todos os dias.
- Você não devia estar fazendo isso - resmungou ele, puxando uma cadeira da mesa para se sentar.
- Não foi você mesmo quem disse que hoje é um dia como outro qualquer? - ela soltou uma risadinha quando ele produziu um som de desdém típico de sua personalidade.
- Um homem não pode mudar de ideia?
- Um homem não pode mudar de ideia?
Ela não respondeu, limitou-se a colocar o velho bule sobre a mesa e a tomar assento.
- Que cheiro bom! - o marido elogiou enquanto preenchia com o líquido negro uma xícara branca de detalhes esverdeados. - Você não vai beber também? - perguntou, segundos depois, quando percebeu que a esposa o olhava fixamente. Ela respondeu negativamente balançando a cabeça, pois não acreditava que pudesse falar algo naquele momento.
- Aconteceu alguma coisa, mulher? Não gosto de ter que falar pelos dois!
Ela juntou as mãos e as colocou no rosto, em um esforço para conter o riso. Normalmente, era ela quem falava o tempo todo, deixando para ele a função de ouvir e resmungar alguma coisa quando achasse necessário dar uma resposta... Mas aquele não era um dia normal. E ela estava nervosa.
- Hoje é dezoito de dezembro, meu velho.
- Eu ainda enxergo os números do calendário!
- Não precisa fazer tipo, machão. Só estamos você e eu.
- Tipo? Quem está fazendo tipo aqui? - ralhou com a esposa. Ela o ignorou, pois já se acostumara aos resmungos do marido. Levantou-se para pegar um vidro com biscoitos caseiros que mantinha sobre a geladeira, mas suas mãos tremiam muito e o pote acabou caindo. Tão rapidamente quanto a idade avançada lhe permitiu, ele se aproximou, perguntando se a esposa estava ferida.
- Não, querido. Estou bem.
- Acho melhor você se sentar. Você está nervosa demais.
- Hoje é um dia especial - ela se sentou com alguma dificuldade. - Não precisa fingir que isso não afeta a você também.
Ele suspirou e se sentou em sua própria cadeira.
- Tudo bem. Eu estou um pouco ansioso, admito. Mas é pra que tudo isso acabe logo. Você não devia ter inventado esse negócio de casamento. Já me bastou uma maldita vez!
Ela riu e segurou a mão dele sobre a mesa.
- Não é todo dia que se completam cinquenta anos de casamento, meu querido.
- Graças ao bondoso Deus - resmungou ele. Ainda sorrindo, ela indagou:
- Lembra-se do dia em que nos conhecemos?
- Minha memória vai tão bem quanto minha visão, se quer saber.
- Você já era resmungão naquele tempo, mas foi piorando com o passar dos anos. Às vezes me pergunto como consigo aturar você.
Ele deu um sorriso malicioso que a fez lembrar-se de tempos antigos.
- Eu acho que sei - disse satisfeito. Ela deu um tapinha carinhoso nas mãos dele e mudou deliberadamente de assunto.
- Ainda guardo uma foto sua daquele primeiro dia... Aliás, ainda tenho todas as nossas fotos.
O marido suspirou e desviou os olhos para o teto por alguns segundos. Que droga de emoção!, brigou consigo mesmo. Contudo, cedeu. E, olhando para a sua companheira de toda uma vida, abriu um sorriso.
- Deixe-me revê-las.
fui comentar e a praga do blog deu pau, comolidar? não quero comentar mais, isso sempre acontece quando venho aqui ¬¬
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